sexta-feira, 12 de abril de 2013

Street art: usar a cidade antes que ela te use

"Street art refere-se a uma forma de expressão artística encontrada em espaços públicos e, assim, aberta e acessível a todos. Isso inclui muitas formas diferentes de graffiti, bem como adesivos e stencils, a alteração de cartazes de propaganda, instalações e reconstrução de uma área especificamente escolhida pelo artista.

Os street artistis quase sempre permanecem anônimos ou são conhecidos apenas por um círculo pequeno de pessoas. "Reclaim the Streets (recuperar as ruas)" é um slogan popular entre os artistas, referindo-se à sua visão crítica da publicidade difundida nas cidades. A arte geralmente implica em um ato ilícito (por exemplo, danos em propriedades e cartazes não autorizadas). O artista, no entanto, não vê nada de ilegal no que estão fazendo.

Artistas de rua promovem a si mesmo, suas atitudes ou idéias específicas em seu trabalho. Assim os trabalhos são "publicidade" para um indivíduo e não um produto no sentido clássico. Suas obras frequentemente assumem um ar de paródia a um anúncio existente. Artistas definem sua motivação como decorrente de uma necessidade de desenhar pessoalmente o espaço público fornecendo uma alternativa para o impacto dominante da publicidade comercial e sua superficialidade, se constituindo como uma saída para expressar sua criatividade."

Essa é a definição de arte de rua feita no livro Street art in Berlin, do Kai Jakob. Achei a publicação abandonada no aeroporto da capital alemã em janeiro do ano passado. Sempre gostei muito de intervenções urbanas, creio que deixam a cidade mais bonita, quebram o padrão cinzento das metrópoles e surpreendem aqueles que circulam pelas ruas.

Há uma discussão muito grande que envolve pichação, grafite e intervenções/instalações urbanas. Algumas são bem aceitas socialmente por serem consideradas criativas, que agregam ao dia a dia da cidade, às vezes até trazem uma crítica ou uma mensagem positiva e bem humorada. Outras são consideradas apenas vandalismo, uma questão de poluição visual que deve ser combatida. O que inicialmente era colocado tudo no mesmo lado da balança foi ganhando diversas classificações. Enquanto uns ainda são considerados "coisa de marginal, só sujeira", outros passaram a ocupar galerias de artes e serem disputados por colecionadores. Independente da forma, raramente paramos para pensar: o que essa expressão significa? Há algum propósito ou mensagem? Existe essa delimitação entre arte e vandalismo dentro da street art? Street art e grafite são duas áreas diferentes?

Talvez seja devido a essa falta de compreensão, de debate sobre a street art que haja diversas polêmicas sobre algumas obras, muitas sendo consideradas preconceituosas ou então com apologia a determinadas condutas. Exemplos disso podem ser encontrados nos vídeos Exit through the gift shop, do Banksy e Fast Life, do MTO. As polêmicas mais recentes que tive notícias envolveram artistas brasileiros. Em agosto de 2012, Os Gêmeos fizeram um grafite em Boston, EUA, que gerou uma manifestação contrária a arte por muitos acreditarem que retratava um terrorista.

Click na imagem para ver mais fotos e um vídeo sobre a obra acima
Em Goiânia, Decy Graffiti também protagonizou um imbróglio envolvendo street art em propriedades privadas. Ele começou a pintar os caixotes metálicos cinzentos de telefonia espalhados pelas calçadas da cidade. Em entrevista para o jornal O Hoje, o artista afirmou que "É claro que achei que seria uma boa maneira de divulgar o nosso trabalho, mas também quis deixar as caixinhas mais bonitas", já que muitas delas eram utilizadas (também sem autorização) para a fixação de cartazes publicitários, gerando uma grande poluição visual.

Resultado: a empresa telefônica pediu para que o artista não pintasse mais as caixas metálicas pois ele não havia pedido autorização e, futuramente, ao serem removidas e devolvidas, elas teriam que estar na cor original, ou seja, cinzas. Ok, cabe a discussão sobre pedir autorização ou não para utilizar o espaço, porém a empresa perdeu uma grande oportunidade publicitária.

Por que não entrar em contato com o Decy, fazer um acordo no qual a empresa apoiava, patrocinava o artista, permitindo que ele continuasse grafitando as caixas telefônicas, mas dessa vez colocando a marca da instituição em um cantinho? Eles poderia usar o discurso: "apoiamos a cultura", "estamos deixando a cidade mais bonita" e, com certeza, ganhariam uma excelente repercussão que poderia até mesmo compensar os custos e o trabalho de, futuramente, repintar todas as caixas, para serem devolvidas.

No post Vergonha em terras alemãs eu coloquei um vídeo da exposição d'Os Gêmeos e eles fazem algumas definições e considerações sobre o grafite que são bem interessantes, mas a que eu mais me identifico é: "Se você não usar a cidade, ela vai te usar". Apropriar-se do espaço público para mostrar que você está ali, que você existe em meio a todo o concreto. Quase um grito de socorro para chamar a atenção para si e seus problemas, suas mazelas. Vale conferir o vídeo e também o site dos artistas, tem vários outros vídeos e links sobre o tema.

Além das ações isoladas de artistas ou pequenos grupos, existem vários projetos bem legais que buscam valorizar e difundir as artes urbanas em uma escala muito maior. O primeiro que vou destacar aqui é o Street Art View. É um Google Maps de grafite e instalações. Você acessa o site e vai navegando pelos países, estados, cidades e bairros por meio das marcações já existentes. Se você sabe onde existe alguma arte que não esteja marcada, você pode criar a tag com a localização. Porém, há uma pequena falha nesse processo. Street Art é um processo efêmero, espontâneo e mutante. Algumas das marcações mostram prédios que já foram repintados, apagando a obra que existia ali  Há um mês atrás estava em São Paulo, registrei algumas pinturas, como essa aqui do lado, e quando fui marcar no mapa, as imagens dos muros no sistema estavam desatualizadas, então os grafites não existiam, segundo o site. Porém, é uma boa iniciativa, pois é uma forma de encontrar as obras que, por vezes, passam despercebidas, assim como se constitui como um permanente registro de obras que já foram apagadas.

Um outro projeto que está ganhando força no país e usa o mesmo sistema de localização do Google Maps é o Color+City. A ideia é simples: você tem um muro aí dando bobeira, gostaria de vê-lo grafitado? Então tire uma foto dele, cadastra no mapa, colocando o endereço certinho e pronto. Você quer um muro para grafitar? Basta localizar os pontos disponíveis, se candidatar, entrar em contato e mãos a obra. Quer ver o resultado? Entre no site, selecione as intervenções feitas e confira as fotos.



É como o Gilberto Dimenstein disse no vídeo acima: além de criar novas cores, novas linguagens para uma cidade cada vez mais cinza, caótica e apática, o projeto busca transformar o muro, objeto de separação, em um espaço de integração, formando um grande mosaico colorido a céu aberto. Outro aspecto interessante foi apontado pela Natália Garcia: uma cidade colorida te convida a passear por ela. Quando eu estava na Espanha, adorava passar pelas ruas pois sabia que encontraria artistas de rua espalhados por dezenas de praças e esquinas. Na Alemanha, eu enfrentei temperaturas bem próximas a zero e até mesmo negativas só para percorrer a capital procurando essas artes urbanas. É uma quebra de realidade e de padrão que chama a atenção, que te conquista, mesmo que por poucos segundos.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

As histórias que ninguém vê

Quando não estamos em um lugar familiar, seja na primeira visita na casa de algum amigo ou quando se está em outra cidade, nos tornamos muito mais observadores. Em ambientes já conhecidos, nosso olhar torna-se adormecido, não reparando pequenos detalhes ou mudanças. Em lugares ainda não explorados por nossa visão, nos atentamos a cada pequeno detalhe para compreender o espaço e o que se passa dentro dele.
Eu sempre fui muito observador, curioso sobre tudo que acontece a minha volta. Nas últimas semanas, vivendo longe de casa, me tornei ainda mais atento. Uma maneira de me localizar e me ambientar mais rápido; de compreender como funciona a cidade, as pessoas que nela vivem e a cultura dominante.

Voltando do almoço há alguns dias, cruzei com um morador de rua que caminhava com os olhos fixos em um livro. A obra, capa laranjada, muito bem conservada, com páginas brancas sem um único amassado, contrastava com o seu leitor, de chinelo desgastado e roupas sujas. Sua atenção com as letras era tamanha que não notou que eu o observava.

Há algumas semanas, vi um morador de rua dormindo em uma calçada em pleno centro movimentado. Pelo menos uma centena de pessoas passava por essa calçada por minuto. Seis horas da tarde e uma temperatura de 15°C acompanhada de uma leve garoa, tendo apenas o chão duro, sujo e úmido como local de repouso. Centenas passavam pelo local, mas simplesmente não enxergavam essa pessoa. Sequer olhavam rapidamente, mesmo que para atentar por onde pisavam e desviar daquele que dormia sob a marquise.

Em 2008, viajei com um grupo de amigos para o Rio de Janeiro para um congresso de comunicação. Em um passeio noturno pelo bairro da Lapa, centro da boemia carioca, paramos para comprar cerveja e um morador de rua se aproximou do nosso grupo e começou a dar cantadas nas gurias que estavam conosco. Resolvemos ver até onde iria aquela situação. Em um determinado momento, aquele senhor viu que um dos meus amigos usava uma camiseta dos Beatles e começou a declamar, de maneira meio desafinada, tropeçando em alguns versos, a música Forever Young. Não preciso dizer o quanto isso surpreendeu a todos. Não é algo usual encontrar um morador de rua que conheça os garotos de Liverpool.

Essas situações inusitadas sempre me fazem refletir sobre a invisibilidade social. Todos esses moradores de rua existem. Possuem uma história. Há uma razão por estarem ali. Simplesmente desviar o olhar ao passar por eles não vai fazer com que desapareçam ou que o problema social seja resolvido. Porém, não temos a capacidade de, individualmente, mudar toda a realidade. Porém, não ignorá-los, de tal forma que voltem a existir no cenário social, que sejam percebidos, pode ser o início de uma transformação. Não precisamos viver em um mundo perfeito. Um mundo um pouco melhor já basta.

Uma coisa que se torna mais nítida para mim a cada dia é que não devemos esperar do Estado a solução de todos os problemas. Ele tem sim suas responsabilidades, mas se podemos fazer algo para melhorar a realidade próxima a nós, por que não fazer? Participar ou ajudar ONGs e projetos sociais é algo tão distante de sua concepção? O discurso “eu já pago muitos impostos, então não preciso me engajar, o Estado que resolva” está sempre na ponta da sua língua? O engajamento social não é pior coisa do mundo, tampouco humilhante, acredite. Também não é feito para ganhar títulos, honrarias e elogios excessivos. É fazê-lo pelo fato de ser o certo.

Isso ajudará no desenvolvimento social. Se você é do tipo mais individualista, pense da seguinte maneira: se você se engajar, buscar atuar de maneira mais efetiva na sociedade, de alguma forma estará proporcionando uma melhoria, por menor que seja, o que será revertido também na melhoria de sua realidade social. A partir do momento que as pessoas perceberem que a mudança da realidade que elas tanto  criticam partem dela, não dos outro, que não devem apenas ficar aguardando as soluções virem do céu, nossa sociedade conseguirá, por fim, melhorar sensivelmente.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Um tratado sobre a amizade

Ela sempre esteve lá, presente no mesmo lugar que eu durante anos. Observava-a atentamente desde o primeiro dia, mas nunca me aproximava. Sempre carreguei a fama de frio, sem coração e individualista. Por um tempo até gostei disso. Ela, sempre meiga e cordial, merecia um amigo melhor do que o desalmado que escreve essas palavras.Mas a vida nos apresenta pequenas reviravoltas e guarda o melhor para o final.

E foi no fim do curso de jornalismo que, sem prévio acordo, ambos pegaram as mesmas matérias. Também sem prévio acordo começaram a se falar. A amizade nasceu de um acordo universitário: um não deixaria o outro desistir de nenhuma matéria. E havia outra promessa mais: ele estaria com ela até o final; mas o final não era aquele.

A relação entre os dois se tornou tão importante e tão surpreendente que não passavam mais de dois dias sem conversarem. Os diálogos passaram a abranger felicidades, dúvidas, medos, angústias e realizações. Família, relacionamentos amorosos, dilemas profissionais ou apenas divagações e desabafos iniciais com um simples "bom dia".

A sintonia entre os dois desenvolvida ao londo das conversas é tamanha que chega ao ponto de um sentir quando o outro está triste. E vai além. Quando a vida de um começa a mudar, pode ter certeza que a do outro não permanecerá do mesmo jeito por muito tempo.

Após a faculdade, mesmo não se vendo todos os dias, não importa se estão separados por alguns quilômetros de distância ou se exite um oceano entre eles, a amizade, o carinho e as conversas continuam diariamente. Nas últimas semanas, toda essa sintonia se mostrou ainda mais forte e verdadeira. Compartilhavam a mesma angústia e frustração profissional.

Porém, a vida de um começou a mudar após uma proposta de trabalho a qual o obrigava a se mudar de sua cidade. Isso lhe causou muito medo, mas ao mesmo tempo, sabia que aquele era o caminho certo a seguir, mesmo não podendo levar seus amigos e família na bagagem de mão. Agora, a outra personagem dessa amizade também recebeu uma proposta de emprego que a obrigará a sair de sua cidade. Vivencia os mesmos sentimentos que outrora seu amigo sentira.

E é essa mudança de vida e de cidade que motivou estas palavras. Um pobre jornalista, ilhado na selva de pedras e sem o mesmo talento na escrita que sua querida amiga, impossibilitado de lhe dar um abraço e um presente de aniversário, nada mais tem a fazer se não dar-lhe um humilde e despretensioso, porém muito carinhoso texto.

Resta a esse aspirante a jornalista torcer para que sua amiga sinta todo o carinho que ele tem por ela enquanto ele escreve essas palavras. Resta a ele desejar-lhe coragem, força determinação e sucesso em mais este novo ano de vida. E dizer-lhe que estará sempre ao lado dela até o fim, só que o fim ainda não chegou. Mas disso ela já sabe.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Reaproveitando ideias


Lavoisier, certa vez, disse: "Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma". Abelardo Barbosa, eternamente conhecido como Chacrinha, o Velho Guerreiro dos programas de auditório, usou parte da teoria de Lavoisier para criar uma das grandes máximas da televisão brasileira: "Nada se cria, tudo se copia". E a filosofia não ficou só na televisão. A música também está repleta de exemplos gritantes de cópia.

Recentemente, dois casos me chamaram a atenção. Um deles envolvendo o novo fenômeno da música britânia, One Direction, também conhecido com a abreviação 1D. O grupo é uma boyband formada no programa X Factor. Após seus integrantes não se classificarem na categoria individual, os jurados do programa sugeriram que se juntassem e formassem uma banda, a One Direction. Acataram o conselho, foram aprovados na fase de grupo e conseguiram o terceiro lugar dentro da competição.. Em setembro deste ano, os garotos lançaram a música Live While We're Young, que rapidamente chegou no topo das músicas mais tocadas. Meninas histéricas, morrendo de amor pelos músicos adolescentes, alto número de visualização do clip no youtube, shows e mais shows pelo mundo. Tudo lindo.



Porém, um pequeno detalhe. Os fãs do 1D podem até não perceber, mas a introdução da música é uma cópia explícita do sucesso Should I Stay or Should I Go, da banda punk The Clash. A boyband deve ter pensado: "Ah, os nossos fãs nem vão conhecer música punk, não faz mal usar". Errado, faz mal sim. Primeiro que é cópia. Segundo que os histéricos pelos britânicos bonitinhos podem não ter percebido, mas fãs de punk e pessoas que acompanham o cenário musical perceberam. E em terceiro lugar: por que uma boyband vai copiar alguma referência de uma banda punk??? Alguns dizem: Pode ser uma homenagem que eles fizeram ao The Clash. Não, não foi. Foi uma cópia mesmo. A própria banda admitiu que o uso do riff inicial foi proposital, pois "é um grande riff", segundo o integrante Harry Styles. Dá uma olhada na música no vídeo abaixo e tire suas próprias conclusões.



Entre os não fãs, a 1D ganhou visibilidade também por outras especulações de cópia. Um desses casos foi protagonizada pelos fãs da banda. Ao verem um dos integrantes da banda usar uma camiseta com o emblema clássico do Ramones (também uma banda punk) e dizer que adorava aquela camiseta, os seguidores da banda pegaram a imagem estampada na camiseta, retiraram o nome da banda e dos integrantes originais e substituíram pelo nome da boyband. Outro caso que ganhou notoriedade foi o fato dos garotos terem gravado um clip supostamente na mesma praia que os norte americanos do Blink 182, banda de hardrock, gravaram um clip satirizando grupos que utilizavam rostos bonitinhos e coreografias para conquistar os fãs. Não vou entrar em detalhes sobre esses outros casos, vou me ater apenas ao plágio do The Clash, pois é fato provado e admito pela banda.

O outro caso no qual "nada se cria, tudo se copia", envolve o Red Hot Chili Peppers e o NX Zero. Não, espera, vamos corrigir isso. Não é o NX Zero e sim a Globo. Daqui a pouco algum leitor pode falar: "Ah, você tá criticando essas bandas porque não gosta delas, é preconceito". Não, não é. Vou exemplificar. Ano passado, os californianos liderados por Anthony Kiedis lançaram a música The Adventure of Rain Dance Maggie. Não vou nem mencionar o quanto a música é boa, com uma linha de baixo de primeira. O que importa aqui é o clip. A banda subiu no terraço de um prédio de frente para a praia e começou a tocar. Quando as pessoas viram o Red Hot tocando, começaram a aglomerar nas quadras e casas nas imediações do palco improvisado. Ficou um clip bem legal, praticamente uma jam.



Em maio, o programa da Globo, Estrelas, apresentado pela Angélica, convidou o NX Zero para fazer algo parecido. A senhora Hulk fez uma entrevista com a banda no terraço de um pequeno prédio, o que despertou a atenção dos transeuntes. Logo após a entrevista, som na caixa. Foi nítida de onde foi tirada a ideia, uma cópia do clip norte americano. Retomando algum possível questionamento quanto ao meu gosto musical. Não, NX Zero não é uma banda que eu goste. Mas poderiam colocar Raimundos, Titãs, Rita Lee, Marcelo Nova, Plebe Rude e até o Garotos Podres com o Ratos de Porão junto que eu estaria comentando a cópia da ideia.



Sei lá, as vezes acho que é subestimar muito a inteligência do seu público. Devem achar que o público não tem um conhecimento amplo. Tá, ok, muitas vezes os espectadores daquele determinado programa ou de determinada banda realmente não conhece outros estilos, não acompanha tantas coisas assim. Mas mesmo assim, é muito feio fazer essas cópias deslavadas. Não é nenhum pecado mortal utilizar alguma ideia que deu certo, ficou legal, fez sucesso, MAS que faça suas alterações, adaptações. Recrie aquele conceito, o estilo. Que utilize isso como uma influência. Todos nós temos referências, influências de outros profissionais, independente de nossa área de atuação. Acredite: não é feio citar de onde você busca inspiração para fazer seu trabalho.

E para mostrar que isso não é algo isolado, eu deixo aqui os vídeos do @victorbarao no canal #scriptease, falando sobre as "coincidências" musicais.



Para ver os outros vídeos da série, basta clicar aqui, aqui, aqui e aqui.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

"Mãe, onde vamos morar agora?"

Grafite feito ao lado do Morro do Bumba

Assim como o anterior, este é um post sobre uma viagem, duras memórias e sérias reflexões. No último, uma reportagem na Revista Piauí me motivou a escrever. Neste, o programa A Liga despertou minhas lembranças e me impulsionou de volta ao blog. O semanário da TV Band abordou a temática dos moradores de áreas de risco. Entre as localidades escolhidas para mostrarem a realidade dos cidadãos estava o Morro do Bumba, em Niterói, região que sofreu um grande deslizamento de terra em 2010 e que visitei em 2011 para a realização da minha monografia.

Meu trabalho era descobrir como se dava a recepção de notícias climáticas por moradoras de áreas de risco. A maioria das pessoas me aconselharam a desistir, que achasse algo mais fácil de pesquisar ou entrevistasse pessoas na minha cidade (Goiânia). Mas quem me conhece sabe que sou determinado. Era um desafio que me motivava, uma oportunidade de viver uma experiência única, embora soubesse que não seria nada fácil. E não foi. Na realidade, enfrentei obstáculos bem maiores que os previstos.

Estava prestes a adentrar em uma realidade completamente diferente e distante da minha. Minha meta era conseguir conversar com o máximo de mulheres possível, para poder desenvolver minha pesquisa. Ainda no albergue no qual estava hospedado, pegando informações sobre a região, o primeiro choque de realidade. Perguntei como chegar ao Morro do Bumba e, com estranhamento, me responderam: "ué, mais o morro não existe mais". É uma coisa que eu nunca tinha parado para pensar: é uma área irregular, de risco, um morro; quando há um deslizamento de terra, o morro acaba, a terra simplesmente não volta ao seu lugar. Poucas casas restaram após o deslizamento de terra que vitimou mais de 200 pessoas.

Morro do Bumba atualmente

Quando cheguei no local, não conseguia acreditar que ali moravam dezenas de família e que praticamente nada sobrou. Mesmo sem resgatar todos os corpos do local, a prefeitura de Niterói foi até o local, fez pequenas obras de saneamento básico, cobriu a base com cimento e transformou em uma praça de recreação, com mesas para jogos, piquenique e duas quadras. Muitos moradores são contra essa obra. "Não resgataram todos os corpos, tem gente lá embaixo ainda, aí o pessoal vem e monta uma praça por cima, acha que fez um grande favor, passa o concreto por cima da história e acha que nada aconteceu?", me relatou uma das moradoras da região.

Nas pessoas com quem conversei, encontrei uma tristeza muito grande e um senso de comunidade, de auxílio, maior ainda. Porém, o que mais me chamou a atenção foi o desanimo dos meus interlocutores. Desamino com o poder público, indo desde a associação de moradores que é apenas uma fachada, até o prefeito e governador, que nada fizeram para impedir tal situação. Existe uma lógica meio complexa nisso tudo e que eu fui traçando ao longo dos relatos que escutava.

Acompanhem comigo: se o poder público realmente investisse na construção de casas populares e programas sociais correlacionados, evitaria que pessoas fossem morar em regiões impróprias, tal como o Bumba, antigo lixão e em área de de risco. Sem condições de morar em um lugar melhor, famílias constroem suas casa em locais irregulares que podem desabar com as chuvas. A área é irregular, mas como todos querem sua fatia no capitalismo, as empresas de luz, telefonia fixa e móvel, entre outras, vão lá, vendem seus serviços sob a vista grossa do poder público, que interessado em sua fatia, cobra os impostos das áreas vizinhas, compradas legalmente, mas deixa o esgoto correr a céu aberto entre as casas. Complicado entender isso né? "Não é para morar aqui, mas já que você tá morando, vou te dar condições pra você ficar morando aqui mesmo, bem longe do centro. Toma energia, para ter sua geladeira e sua televisão, toma sinal de celular para gastar seus bônus com quem você quiser e continuamos fingindo que está tudo bem." Deve ser essa a lógica.
Como disse outra de minhas fontes, "pobre não mora onde quer, mora onde dá". A pessoa está morando ali, em uma área inclinada, sem a menor estrutura de saneamento básico, não é porque ela quer, porque não trabalha, ou porque se acha mais esperta e prefere simplesmente tomar posse do lugar. A minha maior dificuldade era encontrar asa pessoas em casa, pois todas estavam trabalhando. Não são desocupados que vivem do auxilio de bolsas do governo, como muitos pensam.

Resultado do descaso e da vista grossa: chuva forte e moradias frágeis, construídas sob um antigo lixão, causam uma tragédia. Poder público lamenta, desengaveta um discurso pronto e diz que está fazendo o possível para evitar tais incidentes e que tomará medidas para que isso não ocorra novamente.

Os sobreviventes são levados para alojamentos provisórios. Prefeitura dá declarações, afirmando que construirá casas populares para essas famílias. Oferecem um aluguel social de R$400,00. Pera aí: alguém me diz onde é possível alugar uma casa por esse valor no Rio de Janeiro? Como as pessoas que perderam o pouco que tinham podem recomeçar suas vidas com uma ajuda de R$400,00? E por que três anos após o deslizamento que vitimou dezenas de famílias, os sobreviventes continuam esquecidos nos mesmos abrigos "provisórios". Por que após a tragédia no Bumba, novos deslizamentos de terra continuaram vitimando dezenas e mais dezenas de cidadãos todos os anos? Por que o poder público não responde a essas perguntas? É mais barato deixá-los esquecidos e ficar resgatando corpos ano após ano do que fazer uma política pública de prevenção?

Assim como as pessoas com quem conversei na região do Bumba, todos nós vamos ficando cada vez mais anestesiados e descrentes com a realidade, vendo, dia após dia, a política ser feita apenas para os privilegiados, que possuem dinheiro e influência. É muito cômodo olhar apenas para o centro, afastar cada vez mais as misérias da cidade, dar uma disfarçada e achar que o mundo é lindo, tá tudo bem, seguimos caminhando e cantando e seguindo a canção.

Não, não é assim. Precisa-se mudar muita coisa. Todos sabemos que não é fácil. Não é barato. Teria que se mexer no interesse de muitos poderosos. Mas precisa ser feito. Nada de pensamento comunista ou revolucionário. Apenas uma questão de dignidade. 

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Não importa o que eu diga

Não importa o que eu diga, não importa o que os professores nos dizem, não importa o que os livros de história contam. Somente quando você vai até um campo de concentração, escuta as histórias dos sobreviventes, que você tem uma remota noção do que foi o período nazista. Isso é o que digo toda vez que alguém me pergunta como foi visitar um campo de concentração da Segunda Guerra Mundial.

Estava em Berlin, mas, certa manhã, peguei meus mapas e folhetos com dicas turísticas, coloquei no bolso do meu casaco, junto com meu passaporte e fui à estação de trem, rumo a Oranienburg, cidade a 40 minutos da capital alemã. Para quem gosta de história, vale muito a pena pesquisar no google sobre essa cidade. Nela se encontra um dos primeiros campos de concentração nazista, o campo de Sachsenhausen.

O vento constante e a chuva que caia em forma de pequenas flocos congelados fizeram com que uma sensação térmica de dez graus negativos atravessassem meu corpo, protegido por camiseta e duas jaquetas. Com pouco mais de vinte minutos andando pelo local, já não sentia mais minhas orelhas e meu nariz, expostos ao inverno europeu. O primeiro pensamento que tenho é: se eu to com esse frio todo estando com casacos de frio, como os prisioneiros sobreviviam a essas temperaturas sem proteções? Eis que o audioguia que eu havia alugado por dois euros me diz: Um dos castigos utilizados no inverno pelos soldados da SS era enfileirar todos os prisioneiros em frente ao bloco e deixá-los lá, parados, alinhados. Com o passar do tempo, a soma do frio intenso com a debilidade física dos presos  resultava em uma equação fatal. Após algum tempo do lado de fora das cabanas, os mais fracos começavam a cair, mortos pela baixa temperatura.

Quando as tropas aliadas invadiram a Alemanha e libertaram os prisioneiros de campos de concentração e trabalho forçado, também destruíram algumas áreas, porém ainda é possível encontrar as cabanas, com refeitórios e dormitórios, o portão, com os dizerem "O trabalho liberta". A ironia não fica apenas no portão. Sobreviventes relatam que os guardas, ao darem as "boas vindas", apontavam para a grande chaminé ao fundo e diziam: "Só existe uma maneira de sair daqui, e é através daquela chaminé".

Não importa o que eu digo, não importa o que se lê. Só quando você entra nas cabanas, sente o cheiro forte que ainda está impregnado nas madeiras, vê que no espaço da cama, onde cabe uma pessoa de maneira claustrofóbica, dormiam quatro, as vezes cinco em cada um dos três "andares" da cama, que você começa a ter uma remota dimensão do quão apertado eram as condições.

Apenas quando você sente, com suas próprias mãos, as variadas pedras que formam as pistas para o teste das botas fabricadas para o exército nazista é que se consegue imaginar a cena e a dor. Após fabricar os uniformes para as tropas de Hitler, alguns presos ainda eram obrigados a testar a durabilidade. Carregando mochilas que pesavam aproximadamente 20Kg, tal como os soldados usavam nos campos de batalha e calçando as botas de combate, muitas vezes de tamanho inferior ou superior ao pé do prisioneiros que a testava, o mesmo era obrigado a ficar correndo de um lado para o outro nessas pistas com pedras irregulares, soltas e pontiagudas. Ao comando do guarda, o "cobaia" deveria abaixar, ainda com a mochila nas costas e fazer flexões sobre as pedras e voltar a correr. Tudo isso para testar o material e a durabilidade dos calçados. Imaginar as bolhas e ferimentos nos pés, provocados pelos tamanhos errados dos coturnos causa ainda mais agonia em quem pôde caminhar pelas pistas irregulares e se aproximar, mesmo que minimamente, do que essas pessoas vivenciaram.

Quem entra nesses verdadeiros locais de tortura física e psicológica, não lê ou assiste coisas relacionadas à Segunda Guerra Mundial da mesma maneira que antes de conhecer o campo de concentração. Não há como sair a mesma pessoa de um lugar desses. Lendo os relatos de uma sobrevivente do regime de extrema direita na Revista Piauí, não há como retornar mentalmente à visita feita e conseguir construir uma imagem mental um pouco mais fiel à realidade.
Grande parte dos relatos dos sobreviventes, entre eles o de Liwia Jaffe, publicado na citada revista, envolve comida. Mais especificamente a falta dela. Essas fotos aqui ao lado são desenhos feitos pelos presos nas paredes da cozinha em Sachsenhausen. Nota-se claramente que, mesmo sendo tratados como animais, sem qualquer direito, ou até mesmo condições físicas, o senso crítico ainda gritava dentro de seus seres e se refletia nos desenhos. Os soldados raramente entravam na cozinha, o que, de certa forma, garantiu que os desenhos continuassem nas paredes.

A fome, certamente, é a mais cruel das torturas. Mas nunca tinha enxergado o ponto de vista que a filha de Liwia Jaffe disse. "Parece que a necessidade de comer, para quem passa fome, é mais forte do que a própria necessidade de viver. Havia muito poucos casos de suicídio nos campos de concentração, um gesto que não seria tão difícil. Era só atirar-se contra o arame eletrificado. Mas quase ninguém fazia isso; havia o próximo pão. (...)Não se comia para viver; vivia-se para comer.Como se os humanos se tornassem parasitas, vermes enlouquecidos, girando desnecessariamente num vácuo, desesperados atrás de migalhas, não para viver, mas simplesmente para comê-las. Comer para comer. (...) Esse processo de animalização reforçava a ideia que os nazistas tinham de que os prisioneiros eram mesmo como animais e isso os fazia sentir ainda mais ódio, como se a animalização justificasse a perseguição. Ninguém que não esteja passando ou tenha passado fome tem a mais remota noção do que ela seja e dos efeitos que ela provoca no comportamento humano, por mais ética que a pessoa seja. Ninguém sabe se a vida ou, mais absurdamente ainda, os valores de alguém são mais importantes do que comer, quando não se tem comida. Da parte dos nazistas, sua tática consistia em transformar os efeitos da carência de tudo – a fome, a sede, o frio, a sujeira – em causa; como se tudo estivesse acontecendo porque os judeus fossem originalmente como animais, e não o contrário. Essa é a formação básica do processo de alienação: trocar os efeitos pelas causas."

Após horas ininterruptas andando pelo campo, lendo histórias, ouvindo relatos, pegando uma leve chuva e sentindo muito frio, sentei nos degraus de uma das cabanas e fiquei simplesmente olhando o que havia ao meu redor. Não sei quanto tempo se passou, quanto me molhei o quão intensamente meu corpo tremia de frio. Mas não era nada, absolutamente nada, comparado ao que aqueles prisioneiros sofreram. Aquela visita ao lugar onde começou um dos mais violentos, humilhantes e terríveis capítulos da história mundial me marcou para o resto da vida. Mas de uma maneira que não é possível descrever.

Não importa o que eu disse. Creio que nem eu mesmo, tendo visto, tocado, sentido o cheiro, o frio, consigo ter uma remota dimensão do que houve naquele lugar. Mas uma coisa é certa: agora, esse capítulo da história está dentro de mim. Os prisioneiros ainda vivem, através de seus relatos, dentro de mim. Historias, relatos, filmes, reportagens, tudo ganha um novo significado, uma nova dimensão. A vida ganha uma nova dimensão.

sábado, 1 de setembro de 2012

Las calles vivas de Madrid

 Sem dúvida e sem rodeios. As ruas vivas de Madrid me conquistaram de imediato. Para um jovem apaixonado por cultura, desembarcar em uma cidade desconhecida e, em cada esquina, em cada praça, encontrar um artista de rua diferente, cada um mais criativo que o outro, é, sem dúvida, uma experiência fantástica e inesquecível.

A arte é um aspecto importante em toda sociedade. Ajuda a desenvolver o intelecto de sua população, estimula a sensibilidade e, por fim, o senso crítico. Muitos países investem nisso. Pena que o Brasil não. Ter senso crítico pode ser algo perigoso para a alta camada social.

Ser artista de rua não significa necessariamente que a pessoa é desempregada e tem que se apresentar na rua para conseguir ganhar algum dinheiro. Veja essa foto do trio musical.
Flauta transversal, violino e violoncelo. Não são instrumentos baratos. Não se aprende a tocá-los em qualquer lugar. Não são mendigos, desempregados, que estão ali por falta de opção. Pelo contrário, estão se apresentando na rua por opção. Querem ganhar algum dinheiro? Lógico, por que não? Mas, acima de tudo, muitos artistas buscam levar a cultura para os transeuntes. Quantos não tem tempo de parar, ir a um conservatório, a um teatro para apreciar um espetáculo? Então, que se faça o espetáculo na rua, enquanto se espera um metrô, enquanto nos deslocamos de uma reunião a outra.



Ah, as ruas vivas de Madrid... Mais do que a paella, o mosto, o frio agradável e a minha primeira experiência internacional, o que mais me conquistou foi a eferverscência cultural e espontânea de las calles madrileñas

sábado, 25 de agosto de 2012

Vandativismo

Já que falei  sobre ativismo de sofá no último post, vamos continuar com o assunto, mas olhando uma vertente diferente, a de uma galera que sai da frente do PC para agir.

Muitos, quando criança, já pegaram santinhos de candidatos políticos para desenhar por cima, fazendo caricaturas ou criando personagens. Inocente, certo? Sim, mas, desde 2010, algumas pessoas utilizam essa brincadeira para protestar.

No último pleito para deputados, governador, senador e presidente, um grupo denominado Vandativismo percorreu algumas ruas de São Paulo atrás de publicidade política que infringissem a lei que define o que pode e o que não pode durante as campanhas. Ou seja: cavalete em praças e jardins? Proibido. Atrapalhando a passagem de pedestres ou pregados em árvores? Errado. Aí é que entra o grupo: publicidade irregular é vandalizada. Vale atear fogo, jogar fora e até desenhar por cima, pixando a foto dos candidatos e colocando o número da lei em vigor.



Outro grupo que começou a atuar também em 2010 foi o Sujo sua cara. A ideia é basicamente a mesma: pixar, desenhar, vandalizar os cartazes irregulares. Não demorou muito para a moda pegar. Pessoas em outros estados passaram a fazer o mesmo e mandar fotos e vídeos para os grupos. E está aberta a nova temporada de caça aos cartazes irregulares. É uma forma de dizer que não é possível confiar, tampouco levar a sério, políticos que não respeitam a lei.

Muitas vezes o candidato não tem consciência dos cartazes errados, já que são seus cabos eleitorais que colocam de maneira irregular. Mas é uma maneira de dizer aos políticos (e também aos seus cabos eleitorais) que estamos de olho neles, mesmo nas pequenas ações e antes de chegarem ao poder.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Click ativismo

Eu já tinha falado disso em algumas outras postagens no blog. Revolucionários de sofá, preguiçosos. E, lendo mais sobre o assunto, vi que muitos blogs também estão discutindo esse "fenômeno" das redes sociais. Se pararmos para pensar direitinho, a vontade de ajudar os outros sem sair de casa vem ainda da época da internet discada e suas cartas correntes. Quem nunca recebeu um email, com centenas de outros contatos juntos, dizendo que determinada criança tinha uma doença e que o provedor de internet doaria uma quantidade para cada vez que o email fosse encaminhado?

Porém, quanto mais conectado virtualmente, mais esse ativismo de sofá se intensifica. De maneira geral, o slacktivismo (slacker+ativism = ativista preguiço) é a prática de curtir, compartilhar, retuitar assuntos relacionados a causas sociais. Seja divulgar um protesto, salvar animais na rua ou "apenas" criar a conscientização de outros internautas.

O assunto tem causado bastante controvérsia. Pouco tempo atrás presenciei um fato que me fez voltar a pensar no assunto. Existem vários grupos de proteção aos animais em Goiânia. Frequentemente são postadas fotos de cães abandonados, acidentados ou mal tratados. Os voluntários desses grupos e seus seguidores se mobilizam para resgatar esses animais, levando-os para clínicas veterinárias para serem tratados e, posteriormente, conseguem, através das redes sociais, um novo lar para os cachorros.

Em uma dessas postagens, uma pessoa encontrou um cachorro com as quatro patas quebrada, tirou uma foto do animal, foi até a casa dela e postou a foto no grupo, pedindo ajuda, falando que tinha feito a parte dela. Resultado: o animal não resistiu aos ferimentos e morreu. Muitos usuários criticaram a pessoa por ela não ter feito absolutamente nada. Se ela realmente é "amiga dos animais", tal como ela alega, teria agido de maneira mais efetiva, não apenas tirando uma foto e compartilhando no facebook.

Vejo pessoas compartilhando fotos e mais fotos de protestos políticos, apoio a greves, protejam os animais, revoltas sociais. Muitas delas não tem a mais remota noção dos verdadeiros motivos dos protestos, apenas compartilham, fazendo volume. Há também aquelas campanhas que divulgam informações erradas ou tendenciosas. Ao ajudar a "viralizar" essas campanhas, muitos erros podem ser cometidos também. Recentemente, uma foto de uma mãe apontando uma arma para sua filha começou a circular na rede. Foram incontáveis os xingamentos e compartilhamentos na referida foto. Porém, para a surpresa de todos, a foto era uma montagem. A foto originar era da mãe, com o dedo apontado para a filha, porém com um passarinho sobre esse dedo. Cadê as milhares pessoas que haviam xingado a mulher? Onde está o retratamento, postando a foto correta agora? Ops...

Por outro lado, um israelense, vendo todas as notícias de guerra e terror veiculadas na mídia sobre a relação de seu país com o Irã, fez uma montagem em uma foto, falando que amava e não temia a população do outro país, contradizendo a versão dos representantes políticos.

Em pouco tempo, vários conterrâneos fizeram o mesmo, veiculando mensagens nas redes sociais. Dias depois, iranianos começaram a postar as mesmas mensagens, falando que não temiam e não queria a guerra entre as duas nações.

A ação ganhou tamanha forma que foi parar nos meios tradicionais, virando matéria de jornais impressos e televisivos. Pode ser apenas um pequeno exemplo, mas é algo que ganhou força, ganhou repercussão mundial. Isso pode evitar a guerra? Nunca saberemos, mas foi uma ação efetiva de conscientização.

Utilizar twitter e facebook para mobilizar pessoas para passeatas, divulgar informações, também é um exemplo da utilização efetiva do ativismo na internet. O caso mais recente são as revoltas árabes, que culminaram com a queda de vários ditadores. Através das redes, a população pôde postar várias informações, além de fotos e vídeos, divulgando o outro lado da história, não apenas as "informações oficiais".

Não há como precisar se o ativismo online, ativismo de sofá, slacktivismo, click ativismo, seja lá como queira chamar, é um aspecto positivo ou negativo. Pode criar o comodismo em alguns, achando que basta clicar em "compartilhar" e fazer volume para mudar alguma coisa. Mas em muitos, cria a conscientização de alguns fatos não divulgados pelos veículos tradicionais de imprensa. Porém, a atitude ainda é o fator decisivo para que haja a transformação. Ler que um político é corrupto e não ter a atitude EFETIVA de cobrar de maneira correta, ver que um animal está mal tratado mas só tirar uma foto, ver pessoas na rua passando fome e não procurar os órgãos competentes ou até mesmo dar um agasalho, um prato de comida, não mudará nada, não importa quantos compartilhamentos tenha a postagem.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Vergonha em terras alemãs

E o novaiorquino aponta para a lateral de um prédio de uns quatro andares e pergunta: "Aquele ali você conhece, certo?". Olhei para a grande figura humana de pele amarela pintada no edifício. Não fazia ideia do autor. "Mas você não é brasileiro? Como se diz 'The Twins' na sua lingua?", perguntou o norte americano diante do meu desconhecimento. "Os gêmeos?", respondi mais vacilante do que com certeza. "Sim, os brasileiros que saíram de lá e tem pinturas deles em várias cidades aqui na Europa", insistiu o novaiorquino que mora em Berlin há nove anos. Simplesmente assenti com a cabeça, com uma vergonha que não cabia em mim. Momentos antes, andando pelas ruas da capital alemã com o norte americano especialista em street art, eu havia reconhecido as obras de grandes nomes internacionais da arte de rua, tais como Banksy, Blu e El Bocho, mas não consegui reconhecer uma pintura dos artistas do meu próprio país.

Voltei para o hostel pensando no assunto. Eu conhecia artistas internacionais, mas não tinha a mais vaga noção do trabalho de grafiteiros do meu país, os quais era admirados e conceituados no exterior. Eu que era desinformado sobre alguns aspectos culturais do Brasil ou é o país, a cultura nacional que não valoriza devidamente seus artistas e intelectuais, sendo necessário que os mesmos conquistem fama em nações consideradas "desenvolvidas" para que sejam valorizados nas terras tupiniquins?

Já vi muitos exemplos de artistas nacionais que saíram do país, se aventuraram em metrópoles europeias e norte americanas para, só então, voltar ao Brasil e serem reconhecidos pela crítica e pelos cidadãos. Às vezes, não necessariamente para fazer sucesso, mas para conseguirem desenvolver suas potencialidades. Acredito que o Brasil não incentive a cultura tanto quanto deveria ou poderia, obrigando músicos, pintores, acadêmicos, atletas, a ganhar solos estrangeiros para alcançar o máximo de seus desempenhos. Lógico que não podemos generalizar, mas não podemos também descartar que tal realidade exista.

Quando retornei ao Brasil, fui pesquisar sobre as obras, a história, o estilo dos irmãos paulistas, criadores do homem de pele amarela, cabeça chata e longos dedos que habitava o muro de um prédio em Berlin. Não poderia continuar sem conhecer Os Gêmeos e suas sagas. No próprio site dos grafiteiros tem diversas imagens de seus trabalhos. Dentro do site dá pra ler um pouco da trajetória dos dois e ver que um detalhe reforça essa ideia que por tanto tempo martelou minha mente: "Apenas depois de um ano, já com um nome forte no exterios, Os Gêmeos fizeram sua primeira exposição no Brasil, na Galeria Fortes Vilaça, em São Paulo".



Temos que parar de dar mais valor ao que vem de fora, achando que apenas "os gringos" sabem produzir coisas de qualidade. Não entenda isso como um discurso bairrista, regionalista. Não é para fechar as portas para os aspectos internacionais, mas que possamos olhar com maior cuidado, com maior atenção para o que nós produzimos. Garanto que muitas vezes nos surpreenderíamos.

Esse sou eu, novamente com minhas divagações, minhas opiniões, voltando a escrever nesse despretensioso blog.